O motivo mais comum da nossa dificuldade em receber gratidão é não ter consciência de nosso próprio poder de contribuir para a vida das pessoas.
Em um dos períodos mais difíceis em família, com o pai hospitalizado por mais de um ano, sua esposa, médica, cuidou dele com muita dedicação e, por diversas vezes, evitou que erros médicos causassem ainda mais problemas. Em vários momentos buscamos expressar gratidão a ela, que em resposta rejeitava nossas tentativas de dizer o quanto apreciamos sua contribuição e seu cuidado, o quanto contribuía para nós com seu conhecimento, nos dando segurança em um contexto em que nos sentíamos perdidos. Ela ficava brava e dizia: “Não me agradeça! Estou fazendo minha obrigação!”
Seu constante rechaço nos fez pensar: por que é tão difícil para muitos de nós receber gratidão? A Comunicação Não Violenta sugere nos conectarmos de maneira empática com os sentimentos e as necessidades por trás da expressão de gratidão, buscando perceber e saborear como nossas ações estão enriquecendo a vida da pessoa. No entanto, nem sempre isso é algo fácil de fazer.
O ato de expressar (e receber) gratidão verdadeira não é algo tão comum em nossa cultura familiar ou nos ambientes onde circulamos. Muitas pessoas têm dificuldade em aceitar a gratidão, e às vezes essa dificuldade se origina em pensamentos como “É apenas minha obrigação”, “Por que eu deveria me sentir bem por ter feito isso?”, “Não devo me vangloriar”, “Fui pago pra fazer”, “É apenas meu dever”, ou até mesmo “Não mereço esse reconhecimento”.
Da mesma forma que é difícil expressar gratidão quando temos esse pensamento de “obrigação” ou “dever”, se fomos educados a pensar que “É apenas nossa obrigação”, não conseguimos ouvir com facilidade como a vida da pessoa foi beneficiada por nossas ações. Outro pensamento que nos impede de receber gratidão é “Eu não mereço, o que fiz não foi nada, foi apenas algo insignificante”.
Nossa cultura sustenta coletivamente um aspecto problemático sobre o conceito de justiça: o “bom” merece premiação, o “mal” merece punição. É o pensamento de “merecimento” que justifica a violência no caso de punição e que nos bloqueia de receber a gratidão dos outros, pois não acreditamos que “merecemos”.
Outro pensamento que nos impede de receber gratidão é o julgamento de que deveríamos ser “humildes” ao nos sentirmos bem quando alguém nos agradece. Reconhecer a beleza da nossa contribuição para as pessoas não nos faz arrogantes nem superiores a ninguém.
Mas talvez o motivo mais comum da nossa dificuldade em receber gratidão seja porque fomos treinados a obedecer à autoridade, e não a ter consciência de nosso próprio poder de contribuir para a vida das pessoas. Quando começamos a assumir nosso próprio poder, nos permitimos sentir o prazer que é apoiar as pessoas e receber reconhecimento e gratidão.
Que tal praticarmos receber gratidão de uma nova maneira? Te convidamos a “ouvir” por trás de uma expressão de gratidão como uma ação sua contribuiu na vida de outra pessoa.
*Texto originalmente publicado na Revista Viva Saúde. Escrito por Sandra Caselato e Yuri Haasz.